domingo, 6 de abril de 2008

Resenha do Filme "Homo Sapiens 1900"

O filme “Homo Sapiens 1900” é ao mesmo tempo chocante e esclarecedor. Uma obra prima do já consagrado diretor sueco Peter Cohen, por seu “Arquitetura da Destruição”, o longa aborda o polêmico tema da eugenia desde sua concepção até a expressão máxima durante o regime nazista alemão. Com uma descrição e explicação fantástica do assunto, o espectador envolve-se no tema e perplexo fica ao ver até que ponto pode chegar o homem que objetiva a perfeição do ser, a criação de uma verdadeira máquina irretocável, a partir de um misto de estupidez e insanidade.
Muito diferente do que se imagina o pioneirismo no estudo da eugenia não foram nos regimes fascistas em suas mais famosas versões, o italiano e o alemão. Iniciado no início do século XX na pacata e tranqüila Suécia, a prática da eugenia ganhou vários adeptos no mundo, entre eles, Estados Unidos, Rússia e a emblemática Alemanha.
Como Peter Cohen deixa bem claro, a eugenia em si, não é um fato negativo, a partir do momento em que se procura o melhoramento da raça humana. No entanto quando essa prática torna-se obsessiva tendo por objetivo a criação de uma raça humana perfeita, um verdadeiro super-homem indefectível, ela torna-se altamente danosa a humanidade em geral, pois, é posto em prática uma manipulação biológica, que origina para uma limpeza racial.
Repugnante no filme é a forma como a eugenia é vista como uma forma de higienização racial essencial a sociedade moderna, visto que com o desenvolver de um homem superior portador de uma capacidade intelectual de alto nível, a sociedade se harmonizaria proporcionando o aumento da produção industrial. Ainda sobre a criação do homem perfeito, este deve ser encarado como um produto de qualidade, para uma sociedade merecedora e como uma exigência da vida moderna.
Imagens que ficam marcadas para o espectador, são as do micro filme mudo que remonta a eliminação de recém-nascidos portadores de alguma má formação congênita ou qualquer tipo de deficiência. Essa decisão era tomada após a convocação de uma reunião de médicos que tinha o objetivo de decidir sobre o destino do bebê, tão natural quanto uma reunião de negócios. Médicos e biólogos especializados na eugenia viajavam por entre os países europeus e os Estados Unidos pra divulgar e dissipar essa política de extermínio como se fossem as últimas inovações da medicina.
Maior expoente da pesquisa e prática da eugenia e incorporada as suas políticas, a Alemanha cultivou essa busca pela criação do homem ariano perfeito, ou seja, aquela raça já considerada por eles como superior, deveria ter exemplares humanos de uma verdadeira preciosidade biológica. Tamanha loucura, com certeza podemos assim designar, era fruto de uma mente doentia de seu füher Adolf Hitler. Como marcas desse delírio eram sem dúvida, as casas que os nazistas criaram para abrigar mulheres que dariam à luz ao futuro super-homem. Essas "cobaias parideiras" terminaram criando problemas no próprio seio do nazismo, na medida em que o cruzamento sexual entre machos e fêmeas para a reprodução desse homem ideal entrava em choque com o conceito de família que estava na base do regime.
Mas não eram somente os alemães, que executavam esse artifício. Embora estes tenham emblematizado à questão com a política de eliminação de massas em campos de concentração, a União Soviética, sua principal rival ideológica, não ficava para trás. Embora por caminhos opostos, ambos os regimes totalitários recorreram à eugenia como forma de criar o novo homem que propunham. Na URSS de Stálin, a eugenia tinha como foco o cérebro e o intelecto, também com vistas à criação de um novo homem idealizado, capaz de executar as necessidades e demandas do regime. Na Alemanha nazista, a limpeza racial passava pelo corpo, buscava a beleza e a perfeição física nos moldes que deveriam construir o super-homem ariano, viril, forte, atlético.
Essa manipulação biológica como arma para eliminar todos os que não se adaptam ao padrão racial desenvolvido por um ideal fascista de homem, seja fascista, comunista ou liberal, pode tentar ser explicada de um ponto de vista de um ser humano tido como incompleto. Prevalecia o medo da decadência e a incapacidade do homem em saber lhe dar com o diferente, o feio e o disforme, que segundo as teorias fascistas, seriam frutos do progresso.
Num primeiro impacto o filme é de aterrorizar, isso num sentido de total incompreensão de um subjugar do amor, de saber, ou melhor, de não saber o limite da loucura humana. Cohen soube mostrar a situação como ela era e as perspectivas diferentes, os ideais daqueles que defendiam a eugenia. Embora continuemos espantados com mentes que beiram a demência, percebemos que esse não é um fato já superado e enterrado na história. Os neonazistas do agora e as práticas xenófobas podem ser encarados como uma nova etapa dessa política acima de tudo discriminatória. As incontáveis pesquisas e experiências científicas também nos fazem lembrar o assunto, pois o homem ainda continua na pauta da ciência moderna. O longa-metragem vale a pena ser assistido, sem dúvida, pelo conteúdo.

Ficha Técnica
Título Original:
Homo Sapiens 1900
País de Origem: Suécia
Ano: 1998
Duração: 88 minutos

Fichamento de Texto: Capítulo 8 do livro "Anatomia do Fascismo"

Os regimes fascistas que subiram ao poder provocaram um impacto humanitário em função de terem em suas mãos o poder de guerra e morte, e que de fato não fora economizado. Compostos por ingredientes do nacional-socialismo, do conservadorismo e da direita radical, eles tinham em mente a paixão doentia pela regeneração e purificação da nação, sem importar-se com os meios utilizados para conseguirem tal objetivo.

Interpretações Conflitantes:
Fascismo e capitalismo tornaram-se aliados, mas nem sempre com uma confiança recíproca, muito embora sempre que o primeiro chegava ao poder, o segundo adequava-se a ele como uma das melhores opções disponíveis na conjuntura da época. Stálin, durante sua 3ª internacional, simplesmente ignora as raízes autônomas dos fascismos e o fascínio que ele exercia sobre as multidões, a escolha humana de ser adepto ao regime, limitando apenas o fascismo como uma crise de superprodução capitalista. Essa é uma das interpretações nas quais o fascismo é puramente um instrumento do capitalismo. Numa segunda, é totalmente oposta, vendo a comunidade empresarial como vítima do fascismo, inclusive quando tentam de eximir da culpa ao fim do segundo conflito mundial.
A análise do fascismo pode ser feita também através de explicações psíquicas tanto de seus líderes quanto do seu público fiel. Seja pela vaidade e habilidades solucionáticas de Mussolini ou pela mente insana e premeditada de Adolf Hitler, ele apenas deu tão certo durante seu exercício em função do amor doentio e fidelidade da população que o apoiava incondicionalmente.
Evidentemente que um assunto tão complexo e ao mesmo tempo polêmico, recebe inúmeras interpretações. O sociólogo Talcott Parsons (p.340 §2) vê o fascismo como um sistema e produto da história, da mesma forma que os marxistas. Segundo Parsons, o regime surgira em função de um desenvolvimento econômico e social desigual em países que tiveram sua industrialização feita de forma rápida e tardia, como Itália e Alemanha, o que provocara tensões de classes por uma elite pré-industrial existente. Essa tese pode ser combatida se levarmos em consideração o caso francês que contava com uma sociedade dispare com setores camponeses e industriais modernos ao mesmo tempo, sem que se instaurasse um modelo totalitário no poder.
Outra tese semelhante que leva em conta uma sociedade urbana nos fins do século XIX e início do XX é de Hannah Arendt (p.341 §2), onde uma sociedade de massas desenraizadas sem vínculos sociais e intelectuais seria um terreno fértil para o surgimento de uma ditadura de bases populares e poderes ilimitados sem precedentes na história.
Numa outra visão muito criticada, Seymor Lipset (p.343 §1) via o fascismo como um ressentimento de classe média inferior, uma vez que camponeses e artesãos, por exemplo, viam-se comprimidos entre trabalhadores industriais e empresários bem organizados, e saindo como perdedores das mudanças econômicas da época. Concepção errônea, pois o fascismo recebe uma multiplicidade de apoio social, sendo um movimento composto que com êxito abrange todas as classes sociais.
Outra corrente de pensamento criticada é a de que o fascismo perseguia um objetivo econômico em principal, o que não é verdade. O fato era que Hitler queria submeter à economia a fins políticos. Essa corrente via o fascismo como uma ditadura desenvolvimentista, estabelecida com o propósito de acelerar o crescimento industrial pela poupança forçada e pela arregimentação da força de trabalho, podendo apenas ser direcionada ao caso italiano, pois na época, a Alemanha já podia ser considerada uma gigante industrial.
Hitler e Stálin tinham muito em comum, independente do anacronismo ideológico. Alemanha e União Soviética eram países totalitários. Governados por partidos únicos, empregavam uma ideologia oficial, usavam um controle policial terrorista e tinham o monopólio do poder sobre todos os meios de comunicação, sobre as forças armadas e sobre a organização econômica, além de não permitirem alternativas políticas.
Em ambos os regimes, a lei estava subordinada ao ideal político, a concepção racista e a vontade do líder, sendo os mecanismos de controle utilizados para tal objetivos eram semelhantes como forte repressão e campos de concentração. Stálin matava arbitrariamente todos os seus inimigos de classe, já Hitler exterminava seus inimigos raciais, incluindo recém-nascidos e povos inteiros. Outras diferenças é que Stálin governava uma sociedade simplificada após a Revolução Bolchevique, sem grandes conflitos de natureza social e econômica. Já Hitler chega e mantém-se no poder com o assentimento das elites tradicionais, igrejas e proprietários industriais e agrários. Com a utilização de instrumentos homicidas e o foco do regime baseado na autoridade central, o hitlerismo objetivava a supremacia da raça mestra, enquanto o stalinismo, a igualdade universal.
O fascismo pode ser visto também como uma espécie de religião política, uma vez que mobilizava fiéis entorno de ritos e palavras sagradas, estimulando o fervor e uma verdade que não admitia dissidências em países que passavam por uma secularização da sociedade.
A cultura era um elemento muito prezado pelos fascistas, principalmente no que concerne em desenvolver uma cultura própria. No entanto um programa cultural variava de um país fascista para outro e de um período, um estágio para outro. Apesar disso, a cultura fascista conseguiu competir com valores familiares e cristãos, de modo que em países com imenso aparato cultural já existente, como a França, tornaram-se fascistas apenas por meio da conquista.

Fronteiras:
O fascismo foi um fenômeno amplamente imitado, principalmente na década de 30, no auge do sucesso de Alemanha e Itália que se sobrepuseram sobre as democracias. O resultado disso foi o surgimento de modelos semelhantes em diversas partes do mundo como China e Bolívia. Isso se dava, segundo opinião do socialista Gaetano Salvemini (p.354 §1), porque o fascismo abandonava a democracia e a jurisdição pública em função da aclamação popular, sendo um fenômeno resultante de regimes democráticos fracassados, que em vez de ignorar os cidadãos, canalizaram seus anseios para as reconstruções nacionais em projetos de limpeza interna e expansão externa.
O fascismo também é facilmente confundido com as ditaduras militares porque ambos os líderes militarizam suas sociedades, utilizam armas de fogo e amplamente seus uniformes militares. No entanto, é bom que se lembre que nem todas as ditaduras militares são fascistas, pois nesta, os líderes atuam como simples tirania, nem desencadeiam uma excitação popular como no fascismo e tampouco surgem num contexto de democracias anteriores fracassadas.
Fascismo e autoritarismo têm limites que precisam muito bem ser esclarecidos. Os regimes autoritários desrespeitam a liberdade civil e são homicidas brutais, no entanto não são como os fascistas quando o assunto a participação do Estado na economia. Esses preferem abolir a esfera privada na economia, enquanto aqueles aceitam a participação de pessoas e associações econômicas renomadas, da Igreja, entre outros, sendo os principais agentes de controle social desses regimes. Além disso, deixam suas populações bastante desmobilizadas e passivas ao contrário da excitação provocada pelos fascistas. E ainda hesitam em intervir na economia, preferindo um Estado forte, mas limitado, muito diferente das práticas fascistas na economia.
Na Espanha, o general Francisco Franco converteu sua facção Falange em partido único, tornou-se aliado do Eixo e ditador após a tomada do poder após a Guerra Civil Espanhola. Contudo, mesmo utilizando-se de brutal repressão, prezava a tradicional Igreja Católica, os grandes proprietários de terra e o Exército, conferindo-lhes o controle da sociedade. Além de pouco intervir na economia, também não o fazia na vida particular dos espanhóis, desde que se mantivessem passivos,
Portugal ainda diferia mais radicalmente dos fascismos. Embora Salazar fosse o ditador português durante o Estado Novo, prezava um público passivo e um Estado limitado, onde o poder social permanecia nas mãos da Igreja do exército e dos grandes proprietários de terra, sendo capaz ainda de suprimir um movimento fascista, acusando-os de levar o povo a exaltação, de sobrepujar o poder estatal à vida pública e organizar as massas sobre um único partido político, exatamente as características dos fascismos.
Em Vichy, no início da ocupação alemã, os papéis de maior relevo eram conferidos aos militares, à Igreja, aos técnicos especializados e às elites econômicas e sociais estabelecidas, sendo um regime autoritário. Somente quando a Alemanha invade a União Soviética e o partido comunista francês se opõe ao regime, a ocupação alemã torna-se mais severa e Vichy estabelece uma política colaboracionista.

O que é o fascismo?
O fascismo tem que ser definido como uma forma de comportamento político sem um programa definido e amplamente transformadora marcada por uma preocupação obsessiva com a decadência e a humilhação da comunidade, visto como vítima, com preceitos de unidade e pureza, através de um partido único e de base popular formando por militantes nacionalistas engajados e que repudia as liberdades democráticas e visa limpeza étnica e expansão externa por meio de violência e sem estar submetido a restrições éticas ou legais.
O fascismo pode ser encontrado nos dias de hoje sob a forma de limitações de liberdades democráticas, racismo e xenofobia, presentes muito claramente nos Estados Unidos por exemplo. É importante lembrar que o avanço em direção ao poder depende, em certa parte, da severidade da crise, mas também em grande medida, das decisões humanas, tanto da população, quanto dos detentores do poder econômico, social e político.

Fichamento do Texto: Capítulo 1 do livro "Anatomia do Fascismo"

A Invenção do Fascismo:
Criado num reduzido espaço de tempo, o fascismo foi à grande invenção da política no século XX. Responsável, também, por grande parte de seus conflitos e de suas tragédias, foi uma perfeita combinação de uma ditadura antiesquerdista que contava com um incondicional apoio popular.
O termo fascismo tem origem latina significando feixe e remete até o período áureo do Império Romano, mas desde já significando autoridade e unidade de Estado, bem semelhante às características do movimento do despertado no século XX. Utilizado na Itália pela primeira vez por camponeses na última década do século XIX, começou a tomar seu significado atual depois do primeiro conflito mundial, cunhado justamente Benito Mussolini.
Criado oficialmente em Milão em março de 1919 por veteranos de guerra, sindicalistas pró-guerra e intelectuais futuristas, o fascismo tinha objetivos expansionistas (na região dos Bálcãs e do Mediterrâneo) e outros como o sufrágio feminino, o voto aos dezoito anos de idade, a convocação de uma assembléia constituinte, confisco de bens da Igreja, expropriação parcial de todos os tipos de riqueza, através de pesadas tributações.
Cercado de aliados, mesmo que com objetivos e ideais conflitantes como socialistas, sindicalistas e futuristas, além daqueles que almejavam um segundo Risiorgimento italiano, tentando uma revolução nacional para que a Itália chegasse ao status de grande potência, ela logo inspirou movimentos semelhantes em diversas partes da Europa, logo no pós-guerra, com a mesma mistura de nacionalismo, anticapitalismo e violência contra inimigos comuns, burgueses e socialistas. Evidente que não o movimento não tardou a se espalhar pelo mundo, com aspirantes a ditadores e marchas por toda a parte. Já sabido, anos mais tarde, o mais exemplo mais famoso, o Nazismo chegaria ao poder, barbarizando a todos que se opusessem ou interferissem em seus projetos, dizimando milhões de vítimas e levando o mundo ao segundo conflito mundial.

As Imagens do Fascismo:
Há uma série de crenças que tentam explicar o fascismo em algumas sociedades. Uma de que o fascismo fora gerado pelas mazelas da história de determinadas nações, outra de que algumas nações seriam predispostas ao fascismo a partir do entusiasmo das multidões e seu caráter nacional.
É importante lembrar que o anti-semitismo não era um objetivo inicial do fascismo, visto que no caso italiano, judeus eram militantes do partido fascista, o ajudavam financeiramente e o líder Mussolini, tinha alguns deles entre seus melhores amigos. Outra característica fascista que se modificou durante o caminho ao poder foi o espírito anticapitalista e antiburguês. Atacavam os burgueses pela ânsia desesperada apor dinheiro e chegaram à promoter expropriar proprietários de terras e de grandes lojas. No entanto ao chegar ao poder, perseguiram somente os comunistas como dissolução de sindicatos independentes e diminuição do poder de compra do trabalhador para despejar volumes de dinheiro nas indústrias armamentistas. Diante desse anacronismo, surgem duas teorias bastante díspares: o fascismo como uma forma radical de anti-capitalismo, como os objetivos iniciais e que o fascismo viera como socorro e mantenedores do capitalismo em crise.
Isso pode ser visto em função de uma ambigüidade da relação fascismo/capitalismo. Ao mesmo tempo em que, denunciavam as finanças especulativas internacionais (como toda forma de globalização, devido à perda do senso de comunidade), respeitaram as propriedades dos grandes produtores nacionais. Eram contrários a burguesia por esta ser individualista demais para fortalecer a nação e não por explorar a classe trabalhadora. Essa era a crítica ao capitalismo, não sua exploração, mas o seu materialismo, indiferença para com a nação e incapacidade de incitar as almas. O que fora feito, foi o confisco de propriedades de judeus e estrangeiros e a substituição das forças de mercado pela forte administração estatal. No mais, não alteraram a hierarquia social, pois a mazelas poderiam ser sanadas com vontade política para criação de pleno emprego e produtividade.
Desprezando a suavidade da posição política de centro, também não se designavam como direita e tampouco como esquerda. Consideravam que haviam transcendido essas divisões arcaicas e unido a nação. Dessa forma submeteram o indivíduo ao coletivo e transformaram a prática da cidadania e o gozo dos direitos e deveres políticos.
Outra contradição diz respeito à modernização. Pregavam um ideal de vida bucólico contrário a vida urbana secular, as mazelas oriundas do processo industrial e a as cidades urbanas industrializadas. No entanto, desfilavam e carros e aviões modernos, se utilizavam da tecnologia também nas propagandas e no rearmamento do país. Depois que chegaram ao poder, deixaram de lado as vítimas da industrialização para mergulharem numa expressa concentração e produtividade industrial para se inserirem em guerras expansionistas. Na verdade, esses regimes buscavam uma modernidade alternativa, tecnicamente avançada na qual as cisões da modernidade houvessem sido sufocadas pelo controle e integração fascista. A matança de judeus – a negação da racionalidade moderna e o regresso à barbárie – e a limpeza étnica através da ânsia dos eugenistas de buscarem os perfeitos também são duais.
A chegada ao poder e o exercício desse pelos fascismos foram possíveis pela cumplicidade dos membros do establishment e ajuda de pessoas comuns da população. Sem a aquiescência e a concordância do povo, e das elites tradicionais – chefes de Estado, líderes partidários, altos funcionários do governo – o fascismo jamais chegaria ao topo da política. Fazer essa escolha, desviar o olhar para alguns excessos que poderiam ser até mesmo aceitáveis, poderia significar um mal menor, mas que traria um monstruoso final.

Estratégias:
O fascismo era uma criação nova para a era da política de massas, e que apelava às emoções pelo uso de rituais e de cerimônias encenadas e carregadas de retórica. Ele se baseia num sentimento popular sobre as raças superiores, a injustiça das condições atuais e o seu direito de predominar sobre os povos, dito, inferiores. O fascismo torna-se verdadeiro à medida que pode realizar o destino de uma raça, povo e sangue eleito numa luta darwiniana com outros povos, onde sobrevive o melhor e o mais bem preparado. Tudo aquilo que permitisse ao novo homem fascista dominar os demais e levar o povo eleito ao triunfo, possibilitado no sacrifício de sentimentos individuais pelo coletivo e na figura do líder que é capaz de unir o povo sobre um destino histórico.
Quanto a um programa, os fascismos não se prendiam a eles. Mussolini publicou a doutrina fascista num artigo dez anos depois de ter tomado o poder. Já Hitler apresentou um programa (25 pontos de fevereiro de 1920) que declarado como imutável, foi sempre passíveis de digamos, adequações. Eles não se importavam em ter metas claras, e para Mussolini, à vontade e a liderança de um líder era o que um povo moderno necessitava. Os programas de governo eram além de tudo, informais e fluidos, e alterações se davam com freqüência. Enquanto Stálin se preocupava em escrever para comprovar que as políticas por ele adotadas estavam em conformidade com as ditadas por Marx e Lênin, Hitler e Mussolini jamais se preocuparam com informações teóricas dessa natureza.
Em busca de causas que deram origem ao fascismo, traçam-se teorias que muitas vezes de forma pouco clara, podem transformas causas em simples conseqüências. Segundo os marxistas, uma crise do capitalismo dera origem ao fascismo. Incapazes de assegurar a contínua expansão dos mercados, o acesso cada vez mais amplo de matérias-primas e a mão-de-obra sempre barata e obediente, por meio da operação normal dos regimes constitucionais e do livre-mercado, os capitalistas viram-se forçados a alcançar esses objetivos pela força.
Outros vêem a crise da conjuntura da década de 20, como fundadora desses movimentos. Os liberais (o Parlamento) e o mercado não conseguiam resolver esses desafios como: distorções econômicas, desemprego, inflação, agravamento das tensões sociais, acirramento das paixões nacionais, flutuação de moedas, entre outros.
Com muitos inimigos, os fascistas odiavam tanto socialistas quanto liberais. Enquanto a esquerda socialista e internacionalista eram os inimigos, os outros eram cúmplices, uma vez que seu governo não intervencionista com a crença no debate aberto e sem recorrer ao uso da força era responsáveis pela luta de classes desencadeada pelos socialistas. Muitos liberais, inclusive, se dispuseram a cooperar com os fascistas.
Reafirma-se que nos valores fascistas, comunidade vem antes de humanidade, e o respeito aos direitos humanos e procedimentos legai foram suplantados pelo ideal de raça. Cada movimento nacional fascista cria, portanto, seu particularismo cultural, e diferente de outros “ismos”, não são produtos de exportação, onde cada movimento guarda sua receita nacional genuína. Há semelhança apenas num modus operandi.

Para onde vamos a partir daqui?
O fascismo foi uma novidade política mais importante do século XX. Um movimento popular contra a esquerda e contra o individualismo liberal. Ao contemplar o fascismo, vemos como o século XX contrastou com o século XIX, e o que o século XXI tem que impedir. Genericamente foi uma forma palingenética de ultranacionalismo popular, e assim como os vários comunismos ao redor do mundo e as diversas expressões do liberalismo como o de Margaret Thatcher e de Ronald Reagan, o fascismo também teve seus variantes.
Num exame mais minucioso do fascismo, este pode ser divido em cinco estágios, segundo Robert Paxton (p.49 §1): A criação do movimento; seu enraizamento no sistema político; a tomada do poder; o exercício do poder; e o longo período em que o regime faz a opção pela radicalização ou pela entropia. Embora muitas sociedades tenham gerado movimentos fascistas durante o século XX, poucas chegaram a ter efetivamente, regimes fascistas, sendo apenas na Alemanha nazista que o regime fascista aproximou-se dos horizontes extremos da radicalização.