domingo, 6 de abril de 2008

Fichamento de Texto: Capítulo 8 do livro "Anatomia do Fascismo"

Os regimes fascistas que subiram ao poder provocaram um impacto humanitário em função de terem em suas mãos o poder de guerra e morte, e que de fato não fora economizado. Compostos por ingredientes do nacional-socialismo, do conservadorismo e da direita radical, eles tinham em mente a paixão doentia pela regeneração e purificação da nação, sem importar-se com os meios utilizados para conseguirem tal objetivo.

Interpretações Conflitantes:
Fascismo e capitalismo tornaram-se aliados, mas nem sempre com uma confiança recíproca, muito embora sempre que o primeiro chegava ao poder, o segundo adequava-se a ele como uma das melhores opções disponíveis na conjuntura da época. Stálin, durante sua 3ª internacional, simplesmente ignora as raízes autônomas dos fascismos e o fascínio que ele exercia sobre as multidões, a escolha humana de ser adepto ao regime, limitando apenas o fascismo como uma crise de superprodução capitalista. Essa é uma das interpretações nas quais o fascismo é puramente um instrumento do capitalismo. Numa segunda, é totalmente oposta, vendo a comunidade empresarial como vítima do fascismo, inclusive quando tentam de eximir da culpa ao fim do segundo conflito mundial.
A análise do fascismo pode ser feita também através de explicações psíquicas tanto de seus líderes quanto do seu público fiel. Seja pela vaidade e habilidades solucionáticas de Mussolini ou pela mente insana e premeditada de Adolf Hitler, ele apenas deu tão certo durante seu exercício em função do amor doentio e fidelidade da população que o apoiava incondicionalmente.
Evidentemente que um assunto tão complexo e ao mesmo tempo polêmico, recebe inúmeras interpretações. O sociólogo Talcott Parsons (p.340 §2) vê o fascismo como um sistema e produto da história, da mesma forma que os marxistas. Segundo Parsons, o regime surgira em função de um desenvolvimento econômico e social desigual em países que tiveram sua industrialização feita de forma rápida e tardia, como Itália e Alemanha, o que provocara tensões de classes por uma elite pré-industrial existente. Essa tese pode ser combatida se levarmos em consideração o caso francês que contava com uma sociedade dispare com setores camponeses e industriais modernos ao mesmo tempo, sem que se instaurasse um modelo totalitário no poder.
Outra tese semelhante que leva em conta uma sociedade urbana nos fins do século XIX e início do XX é de Hannah Arendt (p.341 §2), onde uma sociedade de massas desenraizadas sem vínculos sociais e intelectuais seria um terreno fértil para o surgimento de uma ditadura de bases populares e poderes ilimitados sem precedentes na história.
Numa outra visão muito criticada, Seymor Lipset (p.343 §1) via o fascismo como um ressentimento de classe média inferior, uma vez que camponeses e artesãos, por exemplo, viam-se comprimidos entre trabalhadores industriais e empresários bem organizados, e saindo como perdedores das mudanças econômicas da época. Concepção errônea, pois o fascismo recebe uma multiplicidade de apoio social, sendo um movimento composto que com êxito abrange todas as classes sociais.
Outra corrente de pensamento criticada é a de que o fascismo perseguia um objetivo econômico em principal, o que não é verdade. O fato era que Hitler queria submeter à economia a fins políticos. Essa corrente via o fascismo como uma ditadura desenvolvimentista, estabelecida com o propósito de acelerar o crescimento industrial pela poupança forçada e pela arregimentação da força de trabalho, podendo apenas ser direcionada ao caso italiano, pois na época, a Alemanha já podia ser considerada uma gigante industrial.
Hitler e Stálin tinham muito em comum, independente do anacronismo ideológico. Alemanha e União Soviética eram países totalitários. Governados por partidos únicos, empregavam uma ideologia oficial, usavam um controle policial terrorista e tinham o monopólio do poder sobre todos os meios de comunicação, sobre as forças armadas e sobre a organização econômica, além de não permitirem alternativas políticas.
Em ambos os regimes, a lei estava subordinada ao ideal político, a concepção racista e a vontade do líder, sendo os mecanismos de controle utilizados para tal objetivos eram semelhantes como forte repressão e campos de concentração. Stálin matava arbitrariamente todos os seus inimigos de classe, já Hitler exterminava seus inimigos raciais, incluindo recém-nascidos e povos inteiros. Outras diferenças é que Stálin governava uma sociedade simplificada após a Revolução Bolchevique, sem grandes conflitos de natureza social e econômica. Já Hitler chega e mantém-se no poder com o assentimento das elites tradicionais, igrejas e proprietários industriais e agrários. Com a utilização de instrumentos homicidas e o foco do regime baseado na autoridade central, o hitlerismo objetivava a supremacia da raça mestra, enquanto o stalinismo, a igualdade universal.
O fascismo pode ser visto também como uma espécie de religião política, uma vez que mobilizava fiéis entorno de ritos e palavras sagradas, estimulando o fervor e uma verdade que não admitia dissidências em países que passavam por uma secularização da sociedade.
A cultura era um elemento muito prezado pelos fascistas, principalmente no que concerne em desenvolver uma cultura própria. No entanto um programa cultural variava de um país fascista para outro e de um período, um estágio para outro. Apesar disso, a cultura fascista conseguiu competir com valores familiares e cristãos, de modo que em países com imenso aparato cultural já existente, como a França, tornaram-se fascistas apenas por meio da conquista.

Fronteiras:
O fascismo foi um fenômeno amplamente imitado, principalmente na década de 30, no auge do sucesso de Alemanha e Itália que se sobrepuseram sobre as democracias. O resultado disso foi o surgimento de modelos semelhantes em diversas partes do mundo como China e Bolívia. Isso se dava, segundo opinião do socialista Gaetano Salvemini (p.354 §1), porque o fascismo abandonava a democracia e a jurisdição pública em função da aclamação popular, sendo um fenômeno resultante de regimes democráticos fracassados, que em vez de ignorar os cidadãos, canalizaram seus anseios para as reconstruções nacionais em projetos de limpeza interna e expansão externa.
O fascismo também é facilmente confundido com as ditaduras militares porque ambos os líderes militarizam suas sociedades, utilizam armas de fogo e amplamente seus uniformes militares. No entanto, é bom que se lembre que nem todas as ditaduras militares são fascistas, pois nesta, os líderes atuam como simples tirania, nem desencadeiam uma excitação popular como no fascismo e tampouco surgem num contexto de democracias anteriores fracassadas.
Fascismo e autoritarismo têm limites que precisam muito bem ser esclarecidos. Os regimes autoritários desrespeitam a liberdade civil e são homicidas brutais, no entanto não são como os fascistas quando o assunto a participação do Estado na economia. Esses preferem abolir a esfera privada na economia, enquanto aqueles aceitam a participação de pessoas e associações econômicas renomadas, da Igreja, entre outros, sendo os principais agentes de controle social desses regimes. Além disso, deixam suas populações bastante desmobilizadas e passivas ao contrário da excitação provocada pelos fascistas. E ainda hesitam em intervir na economia, preferindo um Estado forte, mas limitado, muito diferente das práticas fascistas na economia.
Na Espanha, o general Francisco Franco converteu sua facção Falange em partido único, tornou-se aliado do Eixo e ditador após a tomada do poder após a Guerra Civil Espanhola. Contudo, mesmo utilizando-se de brutal repressão, prezava a tradicional Igreja Católica, os grandes proprietários de terra e o Exército, conferindo-lhes o controle da sociedade. Além de pouco intervir na economia, também não o fazia na vida particular dos espanhóis, desde que se mantivessem passivos,
Portugal ainda diferia mais radicalmente dos fascismos. Embora Salazar fosse o ditador português durante o Estado Novo, prezava um público passivo e um Estado limitado, onde o poder social permanecia nas mãos da Igreja do exército e dos grandes proprietários de terra, sendo capaz ainda de suprimir um movimento fascista, acusando-os de levar o povo a exaltação, de sobrepujar o poder estatal à vida pública e organizar as massas sobre um único partido político, exatamente as características dos fascismos.
Em Vichy, no início da ocupação alemã, os papéis de maior relevo eram conferidos aos militares, à Igreja, aos técnicos especializados e às elites econômicas e sociais estabelecidas, sendo um regime autoritário. Somente quando a Alemanha invade a União Soviética e o partido comunista francês se opõe ao regime, a ocupação alemã torna-se mais severa e Vichy estabelece uma política colaboracionista.

O que é o fascismo?
O fascismo tem que ser definido como uma forma de comportamento político sem um programa definido e amplamente transformadora marcada por uma preocupação obsessiva com a decadência e a humilhação da comunidade, visto como vítima, com preceitos de unidade e pureza, através de um partido único e de base popular formando por militantes nacionalistas engajados e que repudia as liberdades democráticas e visa limpeza étnica e expansão externa por meio de violência e sem estar submetido a restrições éticas ou legais.
O fascismo pode ser encontrado nos dias de hoje sob a forma de limitações de liberdades democráticas, racismo e xenofobia, presentes muito claramente nos Estados Unidos por exemplo. É importante lembrar que o avanço em direção ao poder depende, em certa parte, da severidade da crise, mas também em grande medida, das decisões humanas, tanto da população, quanto dos detentores do poder econômico, social e político.

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