domingo, 6 de abril de 2008

Fichamento do Texto: Capítulo 1 do livro "Anatomia do Fascismo"

A Invenção do Fascismo:
Criado num reduzido espaço de tempo, o fascismo foi à grande invenção da política no século XX. Responsável, também, por grande parte de seus conflitos e de suas tragédias, foi uma perfeita combinação de uma ditadura antiesquerdista que contava com um incondicional apoio popular.
O termo fascismo tem origem latina significando feixe e remete até o período áureo do Império Romano, mas desde já significando autoridade e unidade de Estado, bem semelhante às características do movimento do despertado no século XX. Utilizado na Itália pela primeira vez por camponeses na última década do século XIX, começou a tomar seu significado atual depois do primeiro conflito mundial, cunhado justamente Benito Mussolini.
Criado oficialmente em Milão em março de 1919 por veteranos de guerra, sindicalistas pró-guerra e intelectuais futuristas, o fascismo tinha objetivos expansionistas (na região dos Bálcãs e do Mediterrâneo) e outros como o sufrágio feminino, o voto aos dezoito anos de idade, a convocação de uma assembléia constituinte, confisco de bens da Igreja, expropriação parcial de todos os tipos de riqueza, através de pesadas tributações.
Cercado de aliados, mesmo que com objetivos e ideais conflitantes como socialistas, sindicalistas e futuristas, além daqueles que almejavam um segundo Risiorgimento italiano, tentando uma revolução nacional para que a Itália chegasse ao status de grande potência, ela logo inspirou movimentos semelhantes em diversas partes da Europa, logo no pós-guerra, com a mesma mistura de nacionalismo, anticapitalismo e violência contra inimigos comuns, burgueses e socialistas. Evidente que não o movimento não tardou a se espalhar pelo mundo, com aspirantes a ditadores e marchas por toda a parte. Já sabido, anos mais tarde, o mais exemplo mais famoso, o Nazismo chegaria ao poder, barbarizando a todos que se opusessem ou interferissem em seus projetos, dizimando milhões de vítimas e levando o mundo ao segundo conflito mundial.

As Imagens do Fascismo:
Há uma série de crenças que tentam explicar o fascismo em algumas sociedades. Uma de que o fascismo fora gerado pelas mazelas da história de determinadas nações, outra de que algumas nações seriam predispostas ao fascismo a partir do entusiasmo das multidões e seu caráter nacional.
É importante lembrar que o anti-semitismo não era um objetivo inicial do fascismo, visto que no caso italiano, judeus eram militantes do partido fascista, o ajudavam financeiramente e o líder Mussolini, tinha alguns deles entre seus melhores amigos. Outra característica fascista que se modificou durante o caminho ao poder foi o espírito anticapitalista e antiburguês. Atacavam os burgueses pela ânsia desesperada apor dinheiro e chegaram à promoter expropriar proprietários de terras e de grandes lojas. No entanto ao chegar ao poder, perseguiram somente os comunistas como dissolução de sindicatos independentes e diminuição do poder de compra do trabalhador para despejar volumes de dinheiro nas indústrias armamentistas. Diante desse anacronismo, surgem duas teorias bastante díspares: o fascismo como uma forma radical de anti-capitalismo, como os objetivos iniciais e que o fascismo viera como socorro e mantenedores do capitalismo em crise.
Isso pode ser visto em função de uma ambigüidade da relação fascismo/capitalismo. Ao mesmo tempo em que, denunciavam as finanças especulativas internacionais (como toda forma de globalização, devido à perda do senso de comunidade), respeitaram as propriedades dos grandes produtores nacionais. Eram contrários a burguesia por esta ser individualista demais para fortalecer a nação e não por explorar a classe trabalhadora. Essa era a crítica ao capitalismo, não sua exploração, mas o seu materialismo, indiferença para com a nação e incapacidade de incitar as almas. O que fora feito, foi o confisco de propriedades de judeus e estrangeiros e a substituição das forças de mercado pela forte administração estatal. No mais, não alteraram a hierarquia social, pois a mazelas poderiam ser sanadas com vontade política para criação de pleno emprego e produtividade.
Desprezando a suavidade da posição política de centro, também não se designavam como direita e tampouco como esquerda. Consideravam que haviam transcendido essas divisões arcaicas e unido a nação. Dessa forma submeteram o indivíduo ao coletivo e transformaram a prática da cidadania e o gozo dos direitos e deveres políticos.
Outra contradição diz respeito à modernização. Pregavam um ideal de vida bucólico contrário a vida urbana secular, as mazelas oriundas do processo industrial e a as cidades urbanas industrializadas. No entanto, desfilavam e carros e aviões modernos, se utilizavam da tecnologia também nas propagandas e no rearmamento do país. Depois que chegaram ao poder, deixaram de lado as vítimas da industrialização para mergulharem numa expressa concentração e produtividade industrial para se inserirem em guerras expansionistas. Na verdade, esses regimes buscavam uma modernidade alternativa, tecnicamente avançada na qual as cisões da modernidade houvessem sido sufocadas pelo controle e integração fascista. A matança de judeus – a negação da racionalidade moderna e o regresso à barbárie – e a limpeza étnica através da ânsia dos eugenistas de buscarem os perfeitos também são duais.
A chegada ao poder e o exercício desse pelos fascismos foram possíveis pela cumplicidade dos membros do establishment e ajuda de pessoas comuns da população. Sem a aquiescência e a concordância do povo, e das elites tradicionais – chefes de Estado, líderes partidários, altos funcionários do governo – o fascismo jamais chegaria ao topo da política. Fazer essa escolha, desviar o olhar para alguns excessos que poderiam ser até mesmo aceitáveis, poderia significar um mal menor, mas que traria um monstruoso final.

Estratégias:
O fascismo era uma criação nova para a era da política de massas, e que apelava às emoções pelo uso de rituais e de cerimônias encenadas e carregadas de retórica. Ele se baseia num sentimento popular sobre as raças superiores, a injustiça das condições atuais e o seu direito de predominar sobre os povos, dito, inferiores. O fascismo torna-se verdadeiro à medida que pode realizar o destino de uma raça, povo e sangue eleito numa luta darwiniana com outros povos, onde sobrevive o melhor e o mais bem preparado. Tudo aquilo que permitisse ao novo homem fascista dominar os demais e levar o povo eleito ao triunfo, possibilitado no sacrifício de sentimentos individuais pelo coletivo e na figura do líder que é capaz de unir o povo sobre um destino histórico.
Quanto a um programa, os fascismos não se prendiam a eles. Mussolini publicou a doutrina fascista num artigo dez anos depois de ter tomado o poder. Já Hitler apresentou um programa (25 pontos de fevereiro de 1920) que declarado como imutável, foi sempre passíveis de digamos, adequações. Eles não se importavam em ter metas claras, e para Mussolini, à vontade e a liderança de um líder era o que um povo moderno necessitava. Os programas de governo eram além de tudo, informais e fluidos, e alterações se davam com freqüência. Enquanto Stálin se preocupava em escrever para comprovar que as políticas por ele adotadas estavam em conformidade com as ditadas por Marx e Lênin, Hitler e Mussolini jamais se preocuparam com informações teóricas dessa natureza.
Em busca de causas que deram origem ao fascismo, traçam-se teorias que muitas vezes de forma pouco clara, podem transformas causas em simples conseqüências. Segundo os marxistas, uma crise do capitalismo dera origem ao fascismo. Incapazes de assegurar a contínua expansão dos mercados, o acesso cada vez mais amplo de matérias-primas e a mão-de-obra sempre barata e obediente, por meio da operação normal dos regimes constitucionais e do livre-mercado, os capitalistas viram-se forçados a alcançar esses objetivos pela força.
Outros vêem a crise da conjuntura da década de 20, como fundadora desses movimentos. Os liberais (o Parlamento) e o mercado não conseguiam resolver esses desafios como: distorções econômicas, desemprego, inflação, agravamento das tensões sociais, acirramento das paixões nacionais, flutuação de moedas, entre outros.
Com muitos inimigos, os fascistas odiavam tanto socialistas quanto liberais. Enquanto a esquerda socialista e internacionalista eram os inimigos, os outros eram cúmplices, uma vez que seu governo não intervencionista com a crença no debate aberto e sem recorrer ao uso da força era responsáveis pela luta de classes desencadeada pelos socialistas. Muitos liberais, inclusive, se dispuseram a cooperar com os fascistas.
Reafirma-se que nos valores fascistas, comunidade vem antes de humanidade, e o respeito aos direitos humanos e procedimentos legai foram suplantados pelo ideal de raça. Cada movimento nacional fascista cria, portanto, seu particularismo cultural, e diferente de outros “ismos”, não são produtos de exportação, onde cada movimento guarda sua receita nacional genuína. Há semelhança apenas num modus operandi.

Para onde vamos a partir daqui?
O fascismo foi uma novidade política mais importante do século XX. Um movimento popular contra a esquerda e contra o individualismo liberal. Ao contemplar o fascismo, vemos como o século XX contrastou com o século XIX, e o que o século XXI tem que impedir. Genericamente foi uma forma palingenética de ultranacionalismo popular, e assim como os vários comunismos ao redor do mundo e as diversas expressões do liberalismo como o de Margaret Thatcher e de Ronald Reagan, o fascismo também teve seus variantes.
Num exame mais minucioso do fascismo, este pode ser divido em cinco estágios, segundo Robert Paxton (p.49 §1): A criação do movimento; seu enraizamento no sistema político; a tomada do poder; o exercício do poder; e o longo período em que o regime faz a opção pela radicalização ou pela entropia. Embora muitas sociedades tenham gerado movimentos fascistas durante o século XX, poucas chegaram a ter efetivamente, regimes fascistas, sendo apenas na Alemanha nazista que o regime fascista aproximou-se dos horizontes extremos da radicalização.

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